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Harmonia da Alma

  • Emerson Campos
  • 23 de mar. de 2020
  • 3 min de leitura

À madrugada densa

Já debruçava seu manto pesado sobre aqueles poucos que vagavam naquele horário pelas ruas pouco iluminadas da pequena cidade interiorana.

A lua, majestosa e bela em seu local de destaque observava o mundo abaixo de si, cheia como uma grande esfera luminosa solitária na imensidão. O vento gelado varria intrépido, toda poeira de cada fresta entre pedras, paredes, construções, e assobiava seu canto melancólico. Todos os cantos da cidade pareciam unir-se em sua desolação solitária, exceto em um lugar: A “casa de shows Dirt Place”. Uma casa de shows com a fachada iluminada por um holofote vermelho que fazia contraste com suas paredes escurecidas, e um letreiro pouco chamativo e consideravelmente desgastado pelo tempo, que indicava o nome do local. Dentro do recinto, ouvia-se todo tipo de sons; conversar, gargalhadas frenéticas, discussões calorosas, jura de amor descartáveis porem, o que realmente ganhava a atenção dentre toda balburdia era o som de um violão flamenco, incendiando animadamente em escalas Gipsy o quase dilúculo Embalava a madrugada que se seguia flamejante, ao menos ali, na Dirt Place. Em um pequeno palco de iluminação propositalmente precária ao fundo da casa, um homem com um, sobretudo preto, botas de fivelas e um chapéu peculiar que encobria com uma sombra insistente seus olhos estava sentado em um banquinho de madeira, absorto da multidão, entregue a melodia que fazia brotar das entranhas de seu violão Folk preto Giannini. Quando a canção termina, um nome é entoado por algumas pessoas em coro no salão: Elf! Elf! Elf! Agora voltando a si, ele se levanta, reverencia o publico; aparentemente surpreso com a reação dos mesmos, como se não tivesse realmente estado lá até aquele momento e sai por uma porta escondida por uma cortina atrás do palco. Sobe um pequeno lance de escadas e vai até o terraço do local. Aplausos! Ouve-se um, depois outro, e mais outro... Ritmados, leves, mas precisos. Envolto pela neblina pesada, um par de olhos vermelhos como rubi oriental faíscam na escuridão. - Foi uma canção maravilhosa, Elf! Diz uma voz feminina, suave e em tom impressionado e animado. - Eu sabia que você estaria aqui. Eu senti quando chegou, e senti quando me observava Kathrina! Quando a nevoa se dissipa, agraciada pela luz do luar, uma mulher bela, esguia, de postura respeitosa e imponente, cabelos longos de um negrume tão intenso quanto o ouro negro de Macaé, e uma tez graciosa torna-se visível. Trajando vestes modernas, uma calça de vinil preta e uma blusinha vermelha de alcinhas finas. Ela sorri para Elf, e num momento seguinte, seus olhos tornam-se de uma coloração indecifrável que toma o lugar do vermelho intenso. - Sim, eu estava vendo você tocar, mas logo subi para te ouvir daqui. Sua musica faz um contraste perfeito com a madrugada. - Eu estava tocando, mas não estava ali. Eu estava distante. Kathrina conhece aquele olhar. Aproxima-se, faz uma volta e fica parada atrás de Elf. Ele então caminha até a beirada, aonde antes se encontrava a moça, debruça no parapeito e fica observando a lua e as ruas enegrecidas pela madrugada que está agora em seu ponto mais obscuro. O vento sopra gélido. Kathrina então, com uma das mãos tocando levemente suas costas, o faz virar-se e olha penetrante em seus olhos.

Elf não consegue disfarçar ou esconder o que se passa em sua mente, o que seu olhar diz. Não dela! Ele então olha fixamente para Kathrina, e depois de um instante assim, sorri para ela. Ela em resposta sorri docemente para ele. Kathrina a muito já sabe que o silencio conhece muito mais modos para se explicar um sentimento do que as palavras em si. Então, em um movimento inesperado, Kathrina enlaça Elf, em um abraço apertado, forte, seguro. Num sobressalto, Elf olha assustado para a mulher, que com os olhos fechados agora se encontra enredada em seu corpo, mas logo em seguida, retribui o gesto apertando-a carinhosamente em seus braços. Com o queixo sobre a cabeça de Kathrina, diz com a voz segura de quem a muito esperou para dizer tais palavras:

- Obrigado por estar aqui...

Logo a escuridão tétrica, resistência da noite contra os raios da manhã, dão lugar a um tom pastel de cores que se transfiguram imperceptíveis aos olhos nus.

A pesada neblina persiste em banhar o cenário e ali parados, abraçados, duas pessoas compartilham do silencio gritante. A melodia mais bela tocada naquele local até então, a Harmonia da alma...


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